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Jornal - Notícias da Igreja

Bispo de Setúbal evoca Igreja

de celebrações «ritualmente perfeitas»

mas onde falta atenção à fome e abandono

O bispo de Setúbal evocou a Igreja católica «que, tantas vezes, organiza solenes celebrações, ritualmente perfeitas, mas onde falta o vinho da cordialidade, da atenção aos que sofrem a fome, a negligência e o abandono».

As palavras de D. José Ornelas, de 62 anos, foram proferidas em Fátima, na missa que assinalou o 99.º aniversário da quinta aparição da Virgem Maria aos pastorinhos, a 13 de setembro de 1917.

«Não é uma receita rápida, nem uma aplicação simples para telemóvel. Tem a ver com o coração, com a atitude de vida, a começar pelo modo de olhar e terminando na conjugação do verbo amar. É um segredo que só se aprende fazendo», afirmou na homilia.

O prelado realçou que muitas vezes «falta o vinho do amor, da ternura, da solidariedade» na Igreja, na sociedade e na família, âmbito ao qual dedicou parte significativa da homilia.

Depois de frisar que a Igreja deve estar atenta às famílias em «situações dramáticas», o bispo de Setúbal salientou que Maria convida a um olhar compassivo para as pessoas e casais em «situações dramáticas de rutura, de violência, de manipulação, de abusos».

A atitude dos católicos, prosseguiu, para esses casos não deve ser «em postura de julgamento, para condenar e estigmatizar, mas em atitude fraterna, para compreender», com «solidariedade e misericórdia».

«Este é o caminho que a Igreja está a tentar percorrer e que, nestes últimos anos, o papa Francisco nos vem recomendando, no seguimento da reflexão do último sínodo [sobre a família], declarou.

Referindo-se aos relacionamentos que terminam com a separação e com o divórcio, D. José Ornelas acentuou que os católicos envolvidos nesses casos «não estão excomungados».

«Aprendamos, antes de mais, e demos espaço ao acolhimento, à solidariedade e ao encorajamento à vida e à ternura nas nossas famílias, nas suas horas felizes e, sobretudo, quando sentem o peso das dificuldades e das crises», assinalou.

A Igreja «é chamada a ser família de solidariedade e de atenção aos mais carenciados, desiludidos e feridos», afirmou o bispo de Setúbal, que lembrou Santa Teresa de Calcutá, «mulher simples, mulher peregrina do mundo e das culturas» que prestou uma «autêntica atenção aos mais pobres».

Na missa a que presidiu à noite, também no santuário da Cova da Iria, D. José Ornelas apelou aos católicos para porem «em prática» a Palavra de Deus, nomeadamente em relação aos migrantes.

«Não olhem com indiferença para os milhões de refugiados e miseráveis, que ficam à margem das estradas da nossa sociedade. Animados pela Palavra e pelo Espírito de Deus, sejam portadores de vida, de misericórdia para as vossas famílias e comunidades», apontou.

Numa celebração evocadora de acontecimentos ocorridos há quase cem anos, o prelado vincou que a Igreja deve estar aberta à novidade: «Abram-se à força renovadora do Espírito e deixem-se guiar por Ele, que é mestre para criar nova vida e nova esperança».

«Não vivam apenas com saudades do passado, como se Deus fosse uma peça dos vossos museus», disse D. José Ornelas, que exortou os fiéis a não terem «medo do mundo que muda tão radical e rapidamente» nem a ficarem «simplesmente a ver passar procissões, mas a tomar ativamente parte nelas».

Para o bispo de Setúbal, que recebeu a ordenação episcopal a 26 de outubro de 2015, «Deus e o seu Espírito estão constantemente a recriar a sua Igreja para que ela seja, não apenas capaz de acompanhar, mas de ser promotora de novidade e de vida em cada época da história».

De acordo com o testemunho das três crianças conhecidas como pastorinhos de Fátima (Lúcia e beatos Francisco e Jacinta), ocorreram seis aparições da Virgem Maria na Cova da Iria e imediações, uma a cada mês, entre maio e outubro de 1917.