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HOMILIA DO 29º DOMINGO COMUM (ANO A)

“Dai a César o que é de César e a Deus o que é de Deus”. Quem desconhece esta frase? Tantas vezes a ouvimos utilizar pelas pessoas e, quem sabe, até nós já a proferimos. Mas, na maior parte das vezes, talvez não se utilize correctamente e não expresse o que Jesus queria transmitir. Não se trata de estabelecer uma simples separação de poderes: o civil e o religioso (uma afirmação que, hoje, nos parece óbvia e que é clara na mentalidade da nossa sociedade). Com esta frase, Jesus quer dizer algo mais. Ele não pensa em dois mundos separados: o de Deus e o dos homens. Qual a sua intenção? O que nos quer dizer?

Na primeira leitura, o profeta Isaías dá-nos o ponto de partida para a reflexão deste dia. Diz-nos que Deus está acima de tudo e de todos. “Fora de Mim não há outro, Eu sou o Senhor e mais ninguém”. Deus não quer controlar e dominar cada um de nós, mas conduzir-nos para o seu projecto salvador: “Eu sou o Senhor e não há outro”. Deus não entra em disputa com o jovem Ciro, rei dos persas e dominador de Israel, mas aproveita as suas qualidades e a sua boa vontade, para exercer através dele a sua providência. Sobre o modo misterioso de agir de Deus, podemos utilizar a célebre frase: “Deus escreve direito por linhas tortas”. Neste caso, aproveita as qualidades de um rei pagão, para pôr fim ao longo exílio de Israel na Babilónia. Ciro, que não conhece o Senhor, vai ser o instrumento providencial de Deus para se iniciar uma nova fase na história do povo de Israel. Deus não manipula a liberdade humana, basta-lhe um coração recto e de boa vontade. E foi isto que Ele encontrou em Ciro que será “sinal” de Deus todo-poderoso diante de todas as nações. Perante este oráculo, voltemos à frase que marca este domingo: Deus ou César? O mais correcto será dizer “Deus em César”.

 

Jesus nunca foi dualista. Nunca dividiu a humanidade em bons e maus; homens e mulheres; puros e impuros; judeus e pagãos. Elogiou a fé de um centurião romano e de uma mulher sirio-fenícia, falou sem preconceitos com uma samaritana. Deus Pai, por Jesus Cristo, ia ao encontro de todos sem fronteiras e sem divisões e Jesus procurava fazer sempre a vontade do Pai: esta foi sempre a sua preocupação e o seu único critério. Todavia, os hipócritas comportam-se com má fé. Assim, opõem-se às realidades humanas, representadas pelo tributo a César e proferem condenações em nome de Deus. Jesus bem sabe que, na realidade, defendem somente a sua honra e os seus próprios interesses. Todavia, aquele que acredita no Senhor, que orienta a sua vida no “faça-se a tua vontade e não a minha”, não se preocupa com preferências sociais ou políticas. Não se “colará” ao César do seu tempo, ou seja, não apoiará politicamente o governante do seu tempo ou local, mas também não o olhará com desprezo e inimizade. Contará com a sabedoria divina para saber escapar às armadilhas dos maldosos do seu tempo. Viverá sem ódio, mas sem ingenuidade.

Para terminar, olhamos para o que diz S. Paulo, juntamente com Silvano e Timóteo, aos cristãos de Tessalónica. Dão graças a Deus pelo aumento das pessoas que aderem à pregação da Boa Nova da Salvação e pela forma como vivem: “recordamos a actividade da vossa fé, o esforço da vossa caridade e a firmeza da vossa esperança”. Só se vive assim, quando “damos a Deus o que é de Deus”.

Na política, na economia e na acção da Igreja, os destinatários são os mesmos: as pessoas. É sempre bom que não haja desentendimentos, porque das decisões que se tomam depende o bem comum, a atenção aos mais necessitados, a melhoria na qualidade de vida, o desenvolvimento das pessoas e das nações. É preciso estar atentos para que a política seja um serviço para criar um mundo mais humano, onde todos se sintam tratados com respeito e com a dignidade de filhos de Deus. Nestes momentos, os cristãos não podem esquecer a missão que lhes foi confiada: “pregar o Evangelho, não somente com palavras, mas também com obras poderosas, com a acção do Espírito Santo”. Que a sociedade de hoje, nas diversas áreas, especialmente na política, na economia, na educação, na justiça e na saúde, conheçam os cristãos como homens e mulheres fortes na fé, firmes na esperança e disponíveis na caridade.