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Bento XVI apresenta encíclica

“Caritas in veritate” – 2

Sem dúvida, é preciso revalorizar atentamente o papel e o poder político dos Estados, numa época em que existem, de facto, limitações à sua soberania por causa do novo contexto económico-comercial e financeiro internacional. E por outro lado, não deve faltar a participação dos cidadãos na política nacional e internacional, graças também a um compromisso renovado das associações dos trabalhadores chamados a instaurar novas sinergias no âmbito local e internacional. Um papel de primeiro nível desempenha, também neste campo, a comunicação social, para a potencialização do diálogo entre culturas e tradições diversas. Querendo, portanto, programar um desenvolvimento não viciado pelas disfunções e distorções hoje amplamente presentes, impõe-se, por parte de todos, uma séria reflexão sobre o sentido da economia e sobre as suas finalidades. Exige-o o estado de saúde ecológica do planeta; pede-o a crise cultural e moral do homem, que aparece com evidência em cada lugar do globo. A economia tem necessidade da ética para seu funcionamento correcto; precisa recuperar a importante contribuição do princípio de gratidão e da “lógica do dom” na economia do mercado, em que a regra não pode ser o próprio proveito. Mas isso só é possível graças ao compromisso de todos, economistas e políticos, produtores e consumidores, e pressupõe uma formação das consciências que dê força aos critérios morais na elaboração dos projectos políticos e económicos. Justamente, de muitas partes se apela ao facto de que os direitos pressupõem deveres correspondentes, sem os quais os direitos correm o risco de transformar-se em livre arbítrio. É necessário – repete-se cada vez mais – um estilo diferente de vida por parte de toda a humanidade, no qual os deveres de cada um com relação ao ambiente se unam aos da pessoa considerada em si mesma e em relação com os demais. A humanidade é uma só família e o diálogo fecundo entre fé e razão não pode senão enriquecê-la, tornando mais eficaz a obra da caridade no social, constituindo, além disso, o marco apropriado para incentivar a colaboração entre crentes e não-crentes, na perspectiva compartilhada de trabalhar pela justiça e pela paz no mundo. Como critérios-guia por esta inter-acção fraterna, na encíclica indico os princípios de subsidiariedade e de solidariedade, em íntima conexão entre si. Sublinhei, finalmente, frente a problemáticas tão vastas e profundas do mundo de hoje, a necessidade de uma autoridade política mundial regulada pelo direito, que se atenha aos mencionados princípios de subsidiariedade e solidariedade e que esteja firmemente orientada pela realização do bem comum, no respeito às grandes tradições morais e religiosas da humanidade. O Evangelho recorda-nos que não só de pão vive o homem: não só com bens materiais se pode satisfazer a profunda sede do seu coração. O horizonte do homem é, sem dúvida, mais alto e mais vasto; por isso, todo o programa de desenvolvimento deve ter presente, junto ao material, o crescimento espiritual da pessoa humana, que está dotada de alma e corpo. Este é o desenvolvimento integral, ao que constantemente se refere a doutrina social da Igreja, desenvolvimento que tem seu critério orientador na força propulsora da “caridade na verdade”. Queridos irmãos e irmãs, oremos para que também esta encíclica possa ajudar a humanidade a sentir-se uma única família comprometida em realizar um mundo de justiça e paz. Oremos para que os crentes, que trabalham nos sectores da economia e da política, advirtam quão importante é a coerência do seu testemunho evangélico no serviço que oferecem à sociedade.

Bento XVI