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Evangelizar a Cidade

(25º aniversário da Cidade de Mangualde)

O dever de anunciar a fé é dinamismo constitutivo da natureza da Igreja. Cada crente, que fez, na sua união a Jesus Cristo, a experiência libertadora da salvação, sente-se impelido, por uma força interior, a anunciar a outros essa experiência como uma boa-nova de vida. A palavra “Evangelho” significa isso mesmo: uma “boa-nova” para todos os que buscam a vida. Evangelizar é proclamar essa “boa-nova”.

O primeiro a revelar uma consciência viva do destino universal da “boa-nova” da salvação, foi o próprio Jesus Cristo. Abraçar a humanidade num acto de amor redentor, expressão do amor com que Deus ama todos os homens, foi a experiência mais profunda de Jesus Cristo. A urgência da proclamação do amor de Deus pelos homens brota do Seu coração e do sentido que deu à Sua vida, oferecendo-a pela humanidade. Ao oferecer a Sua vida no altar da cruz, Cristo sabe que a Sua morte é um ponto de viragem para toda a humanidade. Levar essa notícia a todos os homens e introduzi-los no dinamismo da salvação, decorre da dimensão universal da vida e morte de Jesus Cristo. Ele sabe que, na Sua morte e ressurreição, uma nova luz da esperança brilha para toda a humanidade. A exigência de dar a conhecer essa luz é expressa pelo próprio Jesus na pregação do Reino. Aos discípulos Ele diz: “Vós sois a luz do mundo… Não se acende uma lâmpada para a colocar debaixo do alqueire, mas no lampadário onde possa iluminar todos os que estão em casa” (Mt. 5, 14-15).

 Este dinamismo universal da salvação constitui o último testamento de Jesus aos discípulos, já depois da ressurreição, manifestação da Sua Senhoria e do Seu poder salvador: “Todo o poder me foi dado no céu e na terra. Ide, pois, e de todas as nações fazei discípulos, baptizando-os em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo” (Mt. 28, 18-19).

O Livro dos Actos dos Apóstolos, referindo-se às últimas aparições do ressuscitado, antes da Ascensão, põe na boca de Jesus as seguintes palavras: “Recebereis uma força, a do Espírito Santo que descerá sobre vós. Então sereis minhas testemunhas em Jerusalém, em toda a Judeia e Samaria e até aos confins da terra” (Act. 1,8).

A urgência da evangelização é, assim, um dinamismo constitutivo da missão da Igreja. O testemunho do Apóstolo Paulo confirma-nos essa exigência: “Com efeito, pregar o Evangelho não é, para mim, um título de glória; é uma necessidade que eu sinto. Sim, ai de mim se não pregar o Evangelho” (1Co. 9,16).

 Esta urgência, este dever, são, ainda hoje, parte integrante e essencial da missão da Igreja. É a urgência da “nova evangelização”, de que nos fala João Paulo II. Nas nossas sociedades secularizadas deste nosso Ocidente que alguns já apelidam, com alguma precipitação, de “post-cristão”, sobretudo nas grandes cidades onde as referências cristãs se diluem progressivamente, é urgente anunciar o Evangelho de Jesus Cristo. Perante a urgência da evangelização das nossas sociedades, colocam-se-nos de novo, com a acuidade do momento presente, perguntas velhas de dois mil anos: Quem poderá ser enviado a evangelizar? Qual o conteúdo da sua mensagem? Como fazê-lo de modo a que a boa-nova de Jesus Cristo volte a surpreender os homens e mulheres, nossos irmãos? Todos somos chamados a encontrar respostas para essas questões. Nós sabemos que enviada a evangelizar só a Igreja o é e que o essencial da mensagem é o mesmo desde os Apóstolos, acerca de Jesus morto e ressuscitado e do Espírito Santo que nos dá. Mas a Igreja só será enviada se os seus membros, sacerdotes, religiosos e leigos, o puderem ser com a qualidade interpelante de testemunhas da fé. E as testemunhas não se inventam. Uma Igreja que não possa ser enviada, sempre de novo, com a ousadia das testemunhas, ficará limitada a administrar o que resta de uma tradição crente.